Seguridade social sustentável: o futuro das políticas de proteção social

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FICHA TÉCNICA

Título: Seguridade Social Sustentável: O Futuro das Políticas de Proteção Social

Coordenadores: André Studart Leitão, Zélia Luiza Pierdoná

Edição: Instituto Iberoamericano de Estudos Jurídicos – IBEROJUR

Suporte: Electrónico

Formato: PDF/PDF/A

ISBN: 978-989-36054-1-7

1ª edição: Instituto Iberoamericano de Estudos Jurídicos – IBEROJUR
Porto, Portugal
2025

Citação: LEITÃO, André Studart; PIERDONÁ, Zélia Luiza (Coords.). Seguridade Social Sustentável: O Futuro das Políticas de Proteção Social. Porto: Instituto Iberoamericano de Estudos Jurídicos – IBEROJUR, 2025, 1ª ed., 191 págs. ISBN: 978-989-36054-1-7.

Apresentação: 

É com profundo senso de responsabilidade e compromisso com o futuro da seguridade social brasileira que apresentamos “Seguridade Sustentável: o Futuro das Políticas de Proteção Social”. Vivemos tempos desafiadores, em que a expansão do gasto público, o envelhecimento da população, o avanço da informalidade e o desemprego tecnológico impõem reflexões complexas sobre a sustentabilidade de nosso sistema protetivo. Mais do que um direito fundamental, a seguridade social é uma conquista coletiva que demanda corresponsabilidade e gestão eficiente para garantir sua continuidade.

A concretização de direitos sociais envolve um custo que não pode ser ignorado. O dever de pagar tributos é um pilar essencial, mas, por si só, não é suficiente para sustentar um sistema que enfrenta um cenário de transformações demográficas e tecnológicas. O aumento da expectativa de vida é, sem dúvida, uma conquista civilizatória, que traz consigo um aumento expressivo do número de beneficiários que recebem prestações por períodos cada vez mais longos. Paralelamente, a queda na taxa de natalidade, o aumento da informalidade e a ampliação do desemprego tecnológico reduzem a base de contribuintes, fragilizando o modelo contributivo.

O avanço da automação e da inteligência artificial marca uma nova era com transformações profundas. Novos modelos de negócios substituem ocupações tradicionais, gerando um número significativo de trabalhadores que não conseguem se reinserir rapidamente no mercado formal. Nesse contexto, políticas públicas voltadas para a qualificação e requalificação profissional se tornam imprescindíveis para evitar que o progresso tecnológico se traduza em desigualdade social.

Não se pode desconsiderar o impacto da informalidade, que enfraquece o regime de previdência ao privá-lo de arrecadação regular. A relação entre trabalho formal e segurança previdenciária precisa ser fortalecida com estratégias que estimulem a formalização, sem impor encargos insustentáveis às empresas e aos trabalhadores. O desafio é gigantesco, e soluções simplistas não serão capazes de responder à complexidade desse problema.

Nesse cenário, a judicialização da seguridade social emerge como um tema central. O acesso ao Judiciário é um direito fundamental legítimo, mas sua banalização como forma de obter benefícios que deveriam ser regulados pela via administrativa cria uma série de distorções. Um dos principais problemas é o uso desmedido do princípio da dignidade da pessoa humana como argumento universal. Esse princípio, embora seja um alicerce do nosso ordenamento jurídico, tem sido utilizado como uma espécie de “curinga” na arte de argumentar, servindo de fundamento para decisões que ignoram a lógica contributiva e comprometem a saúde financeira do sistema.

Um exemplo emblemático desse fenômeno foi a declaração de inconstitucionalidade do período de carência para a concessão do salário-maternidade aos segurados contribuintes individuais, facultativos e especiais. Ao eliminar a exigência de um número mínimo de contribuições, com base no argumento de que tal requisito violaria a dignidade da pessoa humana e o princípio da igualdade, o Judiciário desconsiderou que a previdência social é, essencialmente, um regime contributivo. Essa decisão abriu um perigoso precedente ao admitir a concessão de benefícios sem a respectiva contrapartida financeira, o que não apenas desvirtua o caráter protetivo do sistema, mas cria um efeito multiplicador de demandas semelhantes. O resultado é o aumento das pressões sobre um sistema já saturado, comprometendo sua capacidade de atender às necessidades das futuras gerações.

Não podemos ignorar que cada decisão que amplia direitos sem a devida previsão orçamentária afeta a sustentabilidade do sistema e a segurança jurídica das políticas públicas. Direitos sociais são fundamentais, mas só podem ser assegurados de forma perene quando há equilíbrio financeiro e responsabilidade fiscal. Não se trata de negar a proteção social, mas de estabelecer critérios claros e sustentáveis que preservem o sistema como um todo. Qualquer interpretação que privilegie excessivamente os direitos individuais em detrimento do interesse coletivo aproxima-se do cenário descrito por Garret Hardin na “tragédia dos comuns”.

O Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o Bolsa Família são exemplos de políticas indispensáveis para garantir uma rede mínima de proteção aos mais vulneráveis. No entanto, o crescimento exponencial desses programas nos convida a refletir sobre o seu papel: garantir amparo temporário ou fomentar a dependência estrutural? Programas que se tornam permanentes para grande parte de seus beneficiários acabam desestimulando a busca pela inserção no mercado de trabalho formal. Por isso, defendemos que qualquer política de proteção social precisa estar integrada a políticas de capacitação e incentivo à autonomia e à emancipação.

Outro desafio relevante é o aumento das fraudes contra a previdência, como a utilização indevida de benefícios e a “pejotização” disfarçada de vínculos empregatícios. Essa prática, em larga medida, decorre da elevadíssima carga tributária que incide sobre empresas e empregados, comprimindo as margens de lucro de diversos negócios e, em muitos casos, inviabilizando sua sobrevivência. Frente a um cenário tributário tão oneroso, a pejotização surge, para muitos empreendedores, como uma estratégia de redução de custos.

No entanto, essa escolha traz consequências graves. Ao transformar empregados em prestadores de serviços autônomos, muitos trabalhadores são privados de direitos, como férias, 13º salário e proteção previdenciária plena. Além disso, a redução da arrecadação compromete a saúde financeira do sistema protetivo, enfraquecendo a base contributiva necessária para sustentar a concessão de benefícios.

Não podemos ignorar que, em alguns casos, os próprios trabalhadores também se beneficiam desse arranjo temporário, buscando o “melhor dos dois mundos”. Durante o vínculo, aproveitam-se da redução de tributos, como imposto de renda e contribuições previdenciárias, pagando alíquotas menores como pessoa jurídica. Entretanto, após o término do vínculo, muitos ingressam com reclamações trabalhistas para obter direitos retroativos, caracterizando, assim, uma conduta de má-fé.

Essa dinâmica gera um duplo prejuízo: ao trabalhador, que durante o período do vínculo fica sem proteção integral, e ao fisco, que não consegue recuperar os créditos devidos. A prescrição tributária e os entraves operacionais na execução fiscal tornam praticamente inviável a recuperação de valores que deixaram de ser recolhidos, ampliando ainda mais o rombo nas contas públicas.

O combate a essas práticas é imprescindível não apenas para garantir justiça fiscal, mas também para proteger a integridade do sistema previdenciário e assegurar um regime sustentável, que possa continuar cumprindo sua função de amparo social às futuras gerações. Por isso, é necessário um equilíbrio: políticas que reduzam a carga tributária de forma responsável e mecanismos que desestimulem fraudes, fortalecendo tanto a base contributiva quanto a confiança dos trabalhadores e empreendedores no sistema.

É nesse contexto que o Grupo de Pesquisa/CNPq “O Sistema de Seguridade Social” se insere. Temos a honra de coordenar um espaço plural, no qual pesquisadores de diversas formações compartilham ideias, debatem questões complexas e propõem soluções inovadoras. A pluralidade de visões é um dos pilares do grupo, pois acreditamos que não há síntese sem antítese. O confronto respeitoso de ideias é um exercício essencial para a construção de soluções eficazes. Neste livro, fizemos questão de preservar a autenticidade dos textos dos autores, respeitando as divergências e valorizando os contrapontos, na certeza de que eles enriquecem o debate.

A obra é resultado das pesquisas desenvolvidas no âmbito do referido grupo de pesquisa, o qual envolve três Programas de Pós-Graduação em Direito: dois do Brasil, sendo uma instituição da região sudeste e outra da nordeste; e uma da Colômbia. Inclusive, é motivo de honra o prefácio da Professora Martha Elisa Monsalve Cuellar, uma referência internacional em seguridade social e um dos membros mais ilustres de nosso grupo de pesquisa. Além dos pesquisadores (professores e alunos) dos programas envolvidos no projeto, outros também contribuíram com suas pesquisas e apresentaram os resultados neste livro.

Assim, os trabalhos, ora publicados, com o apoio do Instituto Iberoamericano de Estudos Jurídicos – IBEROJUR, são frutos do intercâmbio de experiências e visões, e visam contribuir para um debate que leve à adoção de políticas públicas sustentáveis para, com isso, garantir a proteção social tanto às atuais como às futuras gerações.

Além do diagnóstico, buscamos apontar caminhos para fortalecer a seguridade social de forma justa e sustentável. A preservação do equilíbrio exige uma visão de longo prazo e um compromisso inabalável com a responsabilidade fiscal. Isso significa pensar políticas que alinhem a inclusão social à capacidade financeira do sistema, evitando rupturas que comprometam a confiança dos cidadãos.

A educação previdenciária e tributária, nesse sentido, é um instrumento poderoso. Muitos cidadãos desconhecem o funcionamento do sistema de seguridade social e o impacto de suas escolhas individuais na sustentabilidade coletiva. Um regime contributivo só funciona quando há engajamento e confiança. Quanto mais clara for a compreensão do cidadão sobre o seu papel no sistema, maior será a adesão à formalização do trabalho e ao cumprimento das obrigações fiscais.

Este livro não pretende apresentar respostas definitivas, mas fomentar um debate honesto e construtivo sobre os rumos da seguridade social. Sabemos que os desafios são múltiplos e complexos, mas acreditamos que, por meio do conhecimento, da pesquisa e do diálogo democrático, é possível transformar o cenário atual e construir um sistema de proteção social que atenda às necessidades de todos sem comprometer seu futuro.

Convidamos você, leitor, a percorrer conosco as reflexões e análises que compõem esta obra. Que cada página seja um convite ao pensamento crítico e à corresponsabilidade. Que desperte novas perguntas e inspire novas respostas. A construção de um sistema de seguridade social mais justo, eficiente e perene depende de um compromisso coletivo e constante.

Sejam bem-vindos a essa jornada de reflexão e engajamento. Que ela seja um passo importante na construção de um Brasil mais justo e solidário, no qual a dignidade humana seja respeitada, não como um argumento abstrato, mas como um princípio efetivo, sustentado por políticas públicas responsáveis e financeiramente viáveis.

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Índice | Table of Contents

FORMALIZAÇÃO OU MIGRAÇÃO? IMPACTOS DO REGIME DO MEI NA SUSTENTABILIDADE DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
Adson Romário Rodrigues Santos
Francisca Carolina Pessoa Bezerra
Zélia Luiza Pierdoná

A CRISE DO ENVELHECIMENTO E A SEGURIDADE SOCIAL NO BRASIL: CAMINHOS PARA UMA SUSTENTABILIDADE VIÁVEL
Joana Silveira Campos
Débora Maria Ferreira da Silva

O IMPACTO DA DECISÃO DA ADI 2110 NA SUSTENTABILIDADE DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
Elizete Maria Bartah

OS DESAFIOS DA SUSTENTABILIDADE DA PREVIDÊNCIA SOCIAL NO BRASIL DIANTE DO ENVELHECIMENTO POPULACIONAL E DAS REFORMAS LEGISLATIVAS
Giovanna Creazzo de Aquino Lopes
Neile Batista de Mesquita

SUSTENTABILIDADE DA PREVIDÊNCIA SOCIAL NO BRASIL DO SÉCULO XXI
Franklin Arthur Martinz Filho
André Studart Leitão
Filipe Ticiano de Albuquerque Lobo

IMPACTOS DAS ADIS 2.110 E 2.111 NO SISTEMA DE PREVIDÊNCIA SOCIAL: SUSTENTABILIDADE E DESAFIOS
Débora Maria Ferreira da Silva
Joana Silveira Campos

SUSTENTABILIDADE E JUSTIÇA SOCIAL: O CAMINHO DO BPC PELO FIO DE PETIT
Eduardo Rocha Dias
Kalyl Lamarck Silvério Pereira

GESTÃO NA SAÚDE PÚBLICA: UMA BREVE ANÁLISE SOBRE OS SEUS RESPECTIVOS DESAFIOS E SOBRE A PARTICIPAÇÃO DO TERCEIRO SETOR, OSCIP’S E FUNDAÇÕES PÚBLICAS
Carlos Eduardo Ferreira dos Santos
Laura Cristina Ferreira Cuvello
Marco Aurélio Paganella

ROL DA ANS: ENTRE A SUSTENTABILIDADE E O DIREITO À SAÚDE
Adson Romário Rodrigues Santos
André Studart Leitão

REFORMA TRIBUTÁRIA E A CRIAÇÃO DA CBS: IMPLICAÇÕES PARA A SUSTENTABILIDADE DA SEGURIDADE SOCIAL NO BRASIL
Filipe Ticiano de Albuquerque Lobo
Franklin Arthur Martinz Filho

JUSTIÇA DO TRABALHO COMO INSTRUMENTO DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, SOCIAL E SUSTENTABILIDADE DA SEGURIDADE SOCIAL
Glauco Bresciani Silva

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